06 junho, 2010

O HOMEM DA MÁSCARA...

Já sonhei com ele outras vezes, passando por perto da minha porta ou me seguindo na rua, de longe. Não saberia dizer se isso é sonho ou imaginação, o fato é que eu o sinto. Eu sinto. Seu cheiro na noite a impregnar-me as narinas, Um tufo de vento que me deixa um arrepio e ele aqui, em mim. Tenho medo, medo e desejo.

Como queria sentir seu gosto, o quente da língua... Ele de negro fundindo-se com a noite, me cercando sem mover os pés e eu permitindo.

Não vejo seus olhos sob aquela máscara mas sei que são amorosos. Eu sinto. Sinto. E sinto cada vez mais próximo quando meu corpo acelera com a possibilidade daquele desconhecido.

Deito pura sobre a cama de pele de chinchila e adormeço. Hoje a porta fica entreaberta. Não quero que minha lucidez me impeça de realizar o desejo. A lua há de demorar a se pôr, tão cheia e eu quero a loucura. Pagarei o preço. Pode ser que eu nem sobreviva mas o tempo é finito e não quero pensar.

Um pé de vento bate as janelas, o barulho nos galhos das árvores me deixam apreensiva, parece que tudo em torno cria vida e eu sozinha ali, numa quietude de morte, imóvel a cumprir minha sina. Fui escolhida e haveria de ser minha hora, agora.

Ah, se pelo menos eu tivesse o meu amuleto aqui comigo, aquele que me tirava todo o medo quando eu o apertava entre os dedos e o beijava, me sentiria mais tranquila. Esse guardava todos os meus segredos. Mas eu já o havia perdido há uns alguns anos, fugindo de uma tempestade, quando ainda era uma menina de trancinhas.

Naquele tempo eu lia histórias de mistérios, criava figuras e as tornava vida. Interagia com elas, como seres do céu e da terra, fadas, gnomos, duendes, salamandras, ondinas e outros que só eu conhecia... e vivíamos em eufórica sintonia. Na medida em que fui crescendo alguns se perderam e outros tornaram-se mais companheiros porém já não nos divertíamos como antes e eu só percebia suas presenças quando algo importante estava prestes a acontecer, era o sinal.

Nos meus quinze anos, no baile de máscaras, estavam todos eles. Eu os reconheceria até no meio de uma multidão pois eram especiais pra mim. Eles tinham um cheiro de luz, eram puros de alma e suas auras eram as mais brilhantes que jamais vi.

Ao final, antes de partirem, ouvi: _Um dia, quando já tiveres perdido a inocência e achares que jamais existimos, haverá alguém e ele virá vestido de nós. E toda tua dúvida se extinguirá porque estivemos sempre contigo.

Nesse momento pensei ouvir um suspiro, o que me tirou um pouco do transe mas já não havia mais medo, apenas um esboço de sorriso e paz... muita paz. Em meu quarto, escuridão total e silêncio. E começo a divagar. Imagino dois olhos atentos sobre meu dorso, mapeando-me em carícias ternas. Sinto meus cabelos afagados de leve, como se eu pudesse voar. Meu corpo branco torna-se tântrico, com todos os pontos despertos e eu consigo sentir cada átomo se movendo no ar.

Voltei a ser como quando criança, quando tinha todos os sensores ligados e nenhuma censura. Como era bom aquele mundo de fantasias onde tudo acontecia na exata medida do que eu queria.

E eu ali, inocente e quase nua sobre uma cama que era tão suave como o mundo que criei pra mim, só sentindo... sentindo... e me entregando, permitindo... àquelas mãos que mal encostavam em mim e me faziam tão feliz.

Eu era toda sentidos. Há muito não sentia tanto assim, algo que me transportasse a outras esferas, a algum passado ou a outras vidas. E assim fui ficando líquida, por fora e por dentro de mim, escorregadia e meu corpo foi invadido por extremo calor. E um rubor inchava-me as faces enquanto minhas mãos tentavam segura-se em algo, sem conseguir. Eu estava presa, sendo amada e subjugada pelo vigor de um espectro que me conduzia. Aquilo era tudo pra mim. Era a febre me fazendo cumprir toda a intensidade de uma promessa não proferida.

Nunca senti tanto amor, jamais percebi tanta vontade de ser, em mim e em ti. Ah, homem, como eu te esperei, quanto eu te quis... sabia que seria assim. Essa dança olorosa da libido que me extasia.
Eu aqui, tu em mim, assim, compactados, eternos, simples assim.
Não sei o quanto durou pois me perdi, saí de mim.

Pássaros canoros fazem algazarra em meu jardim. Não, não é hora de acordar, deixem-me dormir. Mas um raio de sol atinge-me os olhos. Sim, amanhece, já é dia. Sinto-me estranhamente leve. Abro os olhos e... em minha cama, sobre a pele, o amuleto que eu havia perdido, uma máscara e um bilhete escrito à nanquim:

“Você sabia que eu voltaria.”

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